Apontamentos sobre a História do Livro de esquerda no Brasil:
No entrementes e nos entretempos de
Edgard Carone e Lincoln Secco

Luccas Eduardo Maldonado*


I


II


III


IV


V


VI


VII


VIII


IX


Referências


Resumen


I

No seu principal estudo, Thomas Kuhn estabelece um modelo de interpretação da história da ciência.1 O autor argumenta que, quando um paradigma se estabelece, quando se constitui uma forma de se fazer ciência, se produz conjuntamente uma série de manuais para expor esse cânone. Trata-se de um tipo de produção para ser entregue aos recém-iniciados visando oferecê-los uma espécie de conhecimento comum da disciplina, uma plataforma de ponto de convergência.2

A construção do físico americano já foi diversas vezes contestada pela bibliografia especializada, contudo ainda se coloca como um ponto de partida interessante para se refletir sobre o saber científico. A capacidade heurística da categoria paradigma mostra-se mais funcional nas ciências exatas e biológicas, âmbitos nos quais se observa um uso dilatado de manuais, do que nas ciências humanas, âmbito no qual tal tipo bibliográfico se mostra extremamente raro. Existem manuais nas humanidades, mas esses se constituem mais como instrumento de divulgação científica, o chamado paradidático, do que um mecanismo de iniciação.

É temerário oferecer qualquer destaque científico ao papel dos manuais nas ciências humanas, talvez seu significado social esteja nos primeiros graus de iniciação no campo acadêmico ainda quando o indivíduo ocupa uma cadeira no ensino básico. No entanto, a consideração de Kuhn sobre obras que servem como pontos de convergência, nas quais os pesquisadores aprendem um domínio comum da disciplina, é especialmente rica, pois serve de horizonte para se designar um conjunto de livros sínteses que fazem parte da historiografia.

Existe na ciência histórica um tipo de publicação que busca fazer sínteses interpretativas a partir de determinados ângulos teórico-metodológicos. Na era da ultraespecialização ou da “história em migalhas”, o movimento se torna mais raro ou no mínimo desestimulado, mas ainda assim continuam a aparecer a partir da pena de alguns pesquisadores instigados por voos mais amplos. Muitos historiadores em movimento de especialização se debruçam sobre tais textos para começar a entender o conteúdo da subárea a que estão se filiando.

O presente artigo pretende comparar dois livros sínteses que se tornaram ponto de referência para a história do livro de esquerda no Brasil: O Marxismo no Brasil de Edgard Carone publicado em 1986 e A Batalha dos Livros de Lincoln Secco publicado em 2017.3 Estudá-los em um movimento comparativo possibilita tirar algumas conclusões a respeito da transformação do conceito de história ao longo do intervalo de aproximadamente 30 anos que marcam as publicações.

Não se usará a categoria de paradigma de Kuhn uma vez que o autor americano visa englobar definições científicas de grande amplitude temporal: como a transposição do modelo newtoniano ao modelo da teoria da relatividade de Albert Einstein. Não se está argumentando sobre um movimento tão significativo como a conversão da filosofia da história do século XIX em historiografia no XX. Argumenta-se que há mais aproximação entre Carone e Secco do que entre Jules Michelet e Marc Bloch para citar um exemplo que sirva de escala. As diferenças geracionais e os contextos sociais são menos largos entre os primeiros. Exatamente por essa obviedade é que se está colocando em questão transformações mais sutis, requisitando conceitos mais adequados para a percepção da reelaboração do trabalho de um mestre diante de um aprendiz, expressão do caso investigado.

Busca-se, assim, categorias que possibilitem identificar a reconstituição do conceito de história nos entrementes e nos entretempos de Edgard Carone e Lincoln Secco. Nessa esteira, pretende-se realizar uma história do conceito de história do livro entre os dois autores. Em outros termos, almeja-se distinguir como cada um concebe realizar o movimento historiográfico sobre esse tipo específico de documento, ponderando no movimento as suas influências teórico-metodológicas, o contexto formativo de cada um e a sua produção textual.4 Ao focar em suas obras que possuem a condição de “livros sínteses”, o texto visa revelar algumas transformações, em primeiro plano, na forma de fazer história no intervalo circunscrito pela pesquisa e, em segundo, algumas transformações contextuais no campo acadêmico.

Para a realização desse movimento, o trabalho do autor como pesquisador na Biblioteca Edgard Carone, disponível para consulta no Museu Republicano de Itu, órgão da USP, foi particularmente importante. A experiência possibilitou um conhecimento substantivo do acervo de Carone. Por isso, a bibliografia lá existente será descrita de tempos em tempos como um recurso explicativo.

II

Lincoln Secco é docente do Departamento de História da USP desde 2003. Seu leque de temáticas conta com razoável amplitude. No mestrado, pesquisou a recepção das ideias de Antonio Gramsci no Brasil. Investida que resultou no livro Gramsci e o Brasil, um état de l’art das apropriações do pensador italiano no país.5 Operou uma certa mudança no sentido investigativo no doutorado, saindo de um estudo circunscrito à História das Ideias e deslocando para uma análise político-social da crise do império colonial português. A empreitada, que se derivou em dois títulos, logo foi suplantada por um interesse em retornar à temática anterior.6 O docente dedica-se desde então principalmente ao marxismo e às esquerdas, tanto em abordagens mais restritas às construções conceituais, quanto em investigações voltadas às expressões dessas correntes políticas como fenômeno social. O último trabalho de Lincoln Secco originou-se exatamente dessa segunda vertente. A obra, intitulada A Batalha dos Livros, é uma pesquisa sobre a história editorial das esquerdas brasileiras. Em grande medida, trata-se de um intento de esmiuçar os caminhos textuais do processo de circulação de ideias de esquerda no Brasil.

Tal trabalho, no entanto, precisa ser melhor situado dentro da trajetória de seu autor. Secco explorou extensivamente ao longo de sua vida acadêmica diversos fenômenos sociais ligados às esquerdas. O seu mais conhecido estudo, devido às diversas reedições e a publicação no exterior, é uma análise sobre a história do Partido dos Trabalhadores (PT).7 Dentro dessa preocupação com os processos sociais, existe também uma atenção de longa data para com a história do livro derivada parcialmente de um ofício de juventude. Quando Secco era pós-graduando em História na USP, trabalhou como assistente na biblioteca particular de seu professor Edgard Carone (1923-2003), sendo motivado por essa oportunidade.8

Carone possuía mais de 26.000 títulos em sua casa, entre eles uma série de obras raras sobre a história das esquerdas. A riqueza do seu acervo possibilitou que realizasse uma ampla pesquisa sobre a história da edição de esquerda no Brasil. O esforço resultou em O Marxismo no Brasil. Primeiro trabalho síntese da história do livro de esquerda no Brasil, uma vez que faz um extenso levantamento desse tipo de publicação no país até 1964. Pode-se fazer alguns questionamentos sobre o que é ou não designado como marxista pelo autor, porém o ponto vulnerável não reduz o tamanho da empreitada e a sua importância na bibliografia especializada. Trata-se de uma espécie de ponto de convergência para os pesquisadores da área.

Em certa medida, Secco é um continuador dessa abordagem que Carone começou a construir. Contudo, há de se fazer algumas considerações antes de se avançar. A história intelectual pode padecer de alguns equívocos. Um possível foi identificado pelo britânico Quentin Skinner, no texto “Significação e compreensão na história das ideias”, como “o mito da coerência”.9 O argumento circunscreve um procedimento reflexivo que procura encontrar uma coerência una, linear, dentro de produções intelectuais amplas. Ao se tomar como premissa a coerência nas produções de determinados autores, torna-se homogêneo aquilo que é múltiplo.

O mito da coerência destacado por Skinner foca-se principalmente nos movimentos analíticos realizados na obra de um único autor. Para citar um exemplo por ele elencado, é conhecido o debate da procura do fio condutor da obra de Karl Marx. Fala-se de corte epistemológico, de jovem e velho Marx... Tudo isso pleiteando a unicidade de uma obra com dezenas de volumes e temas produzida ao longo de décadas. O que Skinner está destacando é que qualquer obra de fôlego, embora tenha sentidos investigativos e o desenvolvimento de problemas, também se marca por viradas, descontinuidades, rupturas etc.

A consideração de Skinner pode ser usada também para explorar a relação de mestre e aprendiz. De fato, entre os diversos “orientandos” que Carone teve enquanto professor na USP, Secco é o que mais se aproxima dele. Ocupa a mesma instituição e departamento em que o antigo professor trabalhou e estuda temáticas parecidas. Todavia, tomar esses pontos convergentes como a expressão de uma coerência inata trata-se de um equívoco. O aprendiz possui uma formação distinta e trabalha a história de maneira diferente ainda que tenha uma dívida formativa para com o mestre. Além de tudo isso, há de se considerar que tal orientação jamais se formalizou institucionalmente, Secco não realizou seu mestrado e doutorado com Carone, mas com Osvaldo Coggiola, docente do mesmo departamento. Contudo, vinculações acadêmicas objetivas não designam necessariamente a constituição de um processo formativo. Na construção intelectual, tudo é mais sutil do que a aparência dos títulos.

III

Visando clarificar as continuidades e as descontinuidades entre eles, analisar-se-á nesse momento a produção de Secco sobre o próprio orientador. Para constituir tal movimento, também se levará em conta o trabalho de um outro assistente de Carone, a docente da Escola de Comunicações e Artes da USP Marisa Midori Deaecto. Personagem que se tornou uma das principais pesquisadoras da História do Livro no Brasil, centrando seus trabalhos sobre temáticas das práticas de leitura no Brasil do século XIX. Não se pretende realizar grandes aprofundamentos sobre Deaecto, os vínculos dessa pesquisadora com Carone requisitam um texto à parte. Contudo, há de se considerar para o presente artigo uma parcela de sua produção, pois os dois assistentes se dedicaram a escrever sobre Carone repetidamente. Existe uma produção a duas mãos que requer atenção e expressa vinculações.

Secco e Midori possuem uma longa trajetória conjunta que perpassa diversas reflexões intelectuais expressas em textos acadêmicos e não universitários, como quando ocuparam rotativamente uma coluna na revista Brasileiros voltada à cultura livresca. Essa empreitada resultou em 2015 na obra Bibliomania a partir da reunião dos textos publicados originalmente na revista.10

O marco inicial dos trabalhos foi a organização em 2004 da coletânea Leituras marxistas e outros estudos, empresa que reúne os escritos de Carone sobre o mundo editorial.11 Como introdução do livro, há um artigo de Secco e Midori, “O homem e os livros: a obra de uma vida”, que esboça uma interpretação da trajetória autoral de Edgard Carone. O texto faz algumas explorações a respeito da importância da biblioteca de Carone enquanto mecanismo de sua produção reflexiva.12 Destacam-se ali considerações sobre como a forma de organização espacial da biblioteca refletia nos escritos do professor. As estantes estavam estruturadas a partir de um horizonte comum que conduzia as suas pesquisas. Fundamental questão que faz rememorar a diferença entre uma biblioteca e um punhado de livros: essa possui um sistema de organização próprio que a caracteriza e a dá sentido; aquele simplesmente é uma reunião de unidades mais ou menos semelhantes. Em suma, uma é organizada e o outro carece de organização. No caso da biblioteca intelectual, existe uma concatenação entre autor-pesquisador e disposição livresca. Procedimento que está associado ao ato cognitivo em si, o qual intenta dispor uma lógica, uma organização, onde originalmente não existia.13

Dez anos depois, uma vez mais os antigos assistentes redigiram um texto sobre o antigo professor.14 Nesse trabalho, postularam que a obra de Carone pode ser entendida como um expoente da plêiade de intelectuais responsáveis por constituir uma interpretação a respeito da realidade brasileira. Seria ele o autor de uma ideia explicativa sobre as transformações políticas que marcaram a história brasileira, realizando nesse movimento um diálogo indireto com a clássica introdução de Antonio Candido de Mello e Souza em Raízes do Brasil.15 O autor de O Marxismo no Brasil, diferentemente de outros “Intérpretes do Brasil” que em geral tomavam os períodos colonial e imperial, constituiu um trabalho mais circunscrito, tangendo exclusivamente o momento republicano. Para ele, essa época seria caracterizada essencialmente por processos políticos de continuação, não havendo rupturas ou revoluções. O argumento não é exatamente original, podendo ser encontrado em outros autores,16 porém de longe Carone foi o que mais mobilizou fontes para sustentá-lo com os 10 volumes de sua coleção sobre a República.17

A produção de Secco revela uma agência de estabelecer pontes para com Carone que extrapola os vínculos temáticos e institucionais. Há uma opção explícita ao se escrever esses textos de se constituir um vínculo de no mínimo intérprete autorizado, no sentido de pesquisador que se debruça e investiga a obra de um pensador. Mostra-se um tanto inevitável que se projete um “mito da continuidade” em uma primeira observação, mas se visa evitar essa projeção. Na realidade, pretende-se destacar com a análise dessa produção a condição de um leitor atento da obra de Carone, de um pesquisador capaz de dialogar intimamente com a produção de um par. Essa interação e por consequência as continuidades e descontinuidades do conceito de história do livro de cada um só serão percebidas com maior clareza a partir do cotejo de suas obras sínteses diante da situação historiográfica.

IV

A Batalha dos Livros de Secco é um desdobramento e um aprofundamento dos estudos editoriais de Carone, mas não é uma “continuidade”. Entende-se por aprofundamento o movimento de dilatação temporal que Secco realiza em sua abordagem em comparação com do mestre. O primeiro alcança o século XXI em sua análise, enquanto que Carone para na década de 1960. Além disso, considera-se as possibilidades mais dilatadas de levantamento de fontes que Carone não tinha a sua disposição. Os recursos técnicos do presente utilizados por Secco são significativamente mais eficientes, possibilitando encontrar materiais que Carone não teve acesso. Em suma, está se englobando o literal avanço do conhecimento histórico que mapeia uma maior quantidade de informações.

Por desdobramento, concebe-se a transformação do conceito de história entre os dois. Processo que não se constitui somente por meio de agências individuais ou puro empirismo de acúmulo de fontes, mas por uma combinação de formação e de movimentos historiográficos. Em grande medida, refere-se às mudanças qualitativas na maneira de se conceber a história ao longo do tempo. É a partir desse prisma que se busca comparar Secco e Carone no momento, tomando como horizonte as suas gerações.

O período de produção de Carone principiou em 1965 e se acentuou nos decênios seguintes, quando construiu a sua extensa obra sobre a república.18 Sua atuação é quase concomitante com o período de expressão da Terceira Geração dos Annales.19 A influência no Brasil de tal forma de exercer o métier d’historien é profunda. A constituição da disciplina histórica no país está expressivamente associada à atuação de Fernand Braudel como docente na USP entre 1935 e 1937.20 A questão em si não é tanto a presença física de integrantes da revista francesa ao sul dos trópicos, mas sim a constante atenção cultivada pelos pesquisadores locais para o que estava sendo produzido pelos membros da famosa publicação.

Edgard Carone aparentemente não ofereceu grande atenção para tudo isso. Não que desconhecesse Fernand Braudel, Marc Bloch, Lucien Febvre e outros autores dos Annales. Por exemplo, dois dos principais livros de Bloch, Apologie pour l’histoire e La société féodale, e um de Febvre, Un destin: Martin Luther, estão em sua biblioteca.21 Graduou-se em história na USP, local onde se dava extensivamente essa bibliografia, porém as categorias mobilizadas por essas personagens jamais se converteram em referencial para seus livros.

Sua Anschauung como historiador derivou-se de uma perspectiva marxista. Contudo, tal termo é um tanto amplo, englobando uma série de autores e correntes. Há de se destacar por isso um núcleo principal, na realidade dois, de autores marxistas que serviram de horizonte teórico-metodológico para Carone. Para isso, tomar-se-á sua biblioteca e sua obra como âmbitos de análise. Explorar somente a sua biblioteca colocar-se-ia como um equívoco devido à enorme cacofonia de autores marxistas lá existentes: Antonio Gramsci, Rosa Luxemburgo, Georg Lukács, Louis Althusser para citar alguns exemplos. Carone era um grande bibliógrafo de esquerda. Presença na biblioteca não quer dizer apropriação de ideias, colocação válida tanto para uma boa parcela dos autores marxistas existentes no espólio do autor brasileiro, quantos aos membros dos Annales citados no parágrafo anterior.

A obra de Carone pode ser dividida em dois núcleos fundamentais.22 O primeiro é uma análise político-social da história da república. O segundo é uma história editorial das esquerdas. Os dois âmbitos estão diretamente vinculados com linhagens da bibliografia marxista que consumiu e com títulos em sua biblioteca.

V

Focar-se-á primeiramente na construção da história da república, buscando compreender o seu conceito de história. Embora não seja o objetivo do artigo analisar essa dimensão da produção de Carone, realizar-se-á alguns comentários devido à centralidade de tal produção para o seu pensamento e trajetória. Foi a partir desses textos que Carone se tornou conhecido. Além do mais, quando o professor realiza a sua produção sobre história editorial, ocorre uma articulação de planos, pois sua história republicana pode ser entendida como uma análise estrutural da história brasileira, enquanto que a história editorial é uma investigação sobre um fenômeno mais circunscrito. Na descrição sobre o desenvolvimento das edições de esquerda, Carone aproveita muitas vezes as suas considerações sobre a república.

Contudo, existem algumas dificuldades em estudar a obra do professor da USP. Existem autores que dispõem uma introdução ou um capítulo primário no qual haure os conceitos balizares de sua análise, ou seja, apresentam uma intenção em situar seus fundamentos analíticos. Essa jamais foi uma preocupação de Carone. Seu foco como pesquisador estava posto na construção da narrativa, no apresentar e manejar da documentação em um sentido histórico. Rememora certas tradições historiográficas que privilegiam a descrição no lugar da explicação.

Obviamente que essa despreocupação em expor os seus horizontes não os fazem desaparecer. Não se trata de uma questão de escolha. Ao se escrever história, mobiliza-se conceitos. Não existe vácuo semântico em um texto. Destacá-los é parte importante para expor os fundamentos do entendimento da história ou de qualquer outra disciplina social. Em grande medida, Carone usava o termo classe como base de sua análise. Por exemplo, mapeia em sua história da república a disputa entre burguesia, proprietários de terra, proletariado etc., introduzindo algumas outras categorias como imperialismo, vanguarda revolucionária e modo-de-produção. Em grande medida, pode-se sintetizar o seu acervo de conceitos para a explicação social como circunscrito ao universo de referências do marxismo de linhagem clássica, fundamentalmente os de autores de origem russa.23 Obras de Vladimir Lenin, Leon Trotsky e Josef Stalin estão extensivamente em sua biblioteca.

Todavia, não basta destacar essa linhagem clássica. É preciso concebê-la no movimento de recepção internacional que marcou o Brasil após a Revolução Russa. Mais precisamente, para se entender a obra histórica de Carone sobre a República, é preciso compreendê-la na linhagem dos escritores marxistas brasileiros que, a partir de meados da década de 1930, tomaram contato com os textos marxistas e se utilizaram dos seus conceitos para interpretar o Brasil. É nessa complexa tradição que Carone aloca-se, não sendo um pioneiro, mas um debatedor da segunda metade do século XX.24

Sua obra, portanto, articula-se com os escritos de Caio Prado Júnior, Nelson Werneck Sodré, Mario Pedrosa e especialmente Leôncio Basbaum. Este último porque foi o primeiro marxista brasileiro a redigir uma análise da história republicana brasileira com os seus quatro volumes da História Sincera da República (1957).25 Movimento que Carone realizou com mais fôlego pouco tempo depois. Tais autores estão extensivamente na biblioteca de Carone, inclusive em algumas oportunidades havendo mais de um exemplar de uma edição.

VI

O segundo núcleo da produção de Carone requer certa atenção porque se está entendendo marxismo de uma maneira um tanto dilatada. Circunscreve-se por tal termo, não os teóricos tradicionais que constituíram interpretações sobre as estruturas sociais visando uma intervenção política, mas também autores europeus que, na segunda metade do século XX, produziram um conjunto de estudos sobre a história dessa tradição de pensamento. Trata-se de estudiosos que buscaram historicizar o marxismo a partir de variados ângulos, investigando seus movimentos sociais e partidos, seus projetos editoriais, suas personagens etc.26

Carone se interessou em escrever sobre história editorial da esquerda a partir dos anos 1980 quando esses pesquisadores europeus já tinham publicado diversos estudos. Uma vez mais não apresentou nos seus textos um capítulo expondo seus fundamentos teórico-metodológicos, fazendo necessário desenvolver ponderações sobre os seus textos e sua biblioteca.

O estudioso e também bibliógrafo alemão Bert Andréas foi um referencial importante para o brasileiro. Detentor de um acervo especializado em história do marxismo de 20 mil volumes atualmente disponíveis para consulta no museu Karl Marx Haus em Trier, mostra-se inevitável encontrar pontos de convergências entre eles. Carone tinha um exemplar de Le Manifeste Communiste de Marx et Engels de Andréas em sua biblioteca.27 Tal estudo é um levantamento sistemático de todas as publicações de O Manifesto Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels. Improvável que uma abordagem com pretensões globais não tenha lacunas. Foi na esteira de suas limitações que Carone produziu um texto investigando a presença de O Manifesto Comunista no Brasil.28 Um diálogo era constituído, inclusive com referências diretas ao livro de Andréas.

A vinculação teórico-metodológica que se projeta entre os historiadores europeus do marxismo e Carone está posta na maneira como esses trabalham as fontes escritas. O professor da USP assume o seu instrumental, entendendo os textos como uma dimensão da estrutura de classes. Tais materiais são descritos como a “expressão ideológica” do proletariado. Dessa maneira, vincula-os à ideologia de uma classe, sendo um componente da superestrutura.

A montagem conceitual de estrutura-superestrutura possui diversos riscos. Um é ler os fenômenos culturais como meros reflexos da estrutura econômica, reduzindo a sua complexidade. O outro é apagar a dimensão processual da história, lendo-a como uma estrutura em si. Em grande medida, tais deturpações foram enunciadas e criticadas em um livro de 1978 de Edward Thompson intitulado A miséria da teoria ou um planetário de erros.29 Nessa obra, esboça-se um diálogo entre marxistas quando o britânico questiona as análises, então em alta, do francês Louis Althusser. Em resumo, Thompson, um dos historiadores europeus do marxismo, colocava-se resistente com os procedimentos simplificadores realizados por Althusser.

Não se pretende aprofundar nessa querela, no entanto destacá-la como um referencial das preocupações da historicidade que atravessavam os historiadores do marxismo europeu em oposição a uma outra tradição marxista. Carone se conectava a uma linhagem do marxismo profundamente preocupada com diversas premissas do trabalho historiográfico. Pode-se ver em seus estudos criterioso trabalho diacrônico, extenso uso de fontes e identificação dos atores. De forma semelhante, pode-se ver tais preocupações no trabalho de Pedro Ribas sobre a introdução do marxismo na Espanha, La introducción del marxismo en España,30 e na coletânea dirigida por Eric J. Hobsbawm sobre a história do marxismo, Storia del marxismo,31 os quais estão presentes na biblioteca de Carone.

Como “Prefácio” de tal coletânea, há um texto de Hobsbawm que vale se atentar.32 O historiador britânico e íntimo interlocutor de Thompson expõe as premissas que fundamentaram o trabalho dos pesquisadores que se integraram à coletânea: a historicidade e a multiplicidade do marxismo; e a identificação das suas vinculações com os movimentos políticos. Tencionando oferecer recursos para pensar nessa esteira, apresenta uma diacronia com fases do marxismo europeu. São diversos procedimentos que também estão presentes na obra editorial de Carone. Não se trata de um transplante para a realidade brasileira, mas um consumo de ideias e conceitos que serviu para Carone conceber à sua maneira de entender a história do livro de esquerda no Brasil. Nesse processo, monta até mesmo a sua própria periodização designando a historicidade dos livros de esquerda brasileiros.

VII

O horizonte de Lincoln Secco tem aspectos diferentes e semelhantes ao de Carone. Os seus temas e as suas abordagens são parecidos. Contudo, Secco faz parte de uma outra geração e possui alguns matizes da produção do seu tempo. Por isso, a “continuidade” entre eles tem que ser trabalhada com certo cuidado. Como já foi posto, os Annales não exerceram grande influência na obra de Carone. Seu discípulo, porém, tem uma relação distinta, sendo mais atento a produção da Terceira Geração dos Annales. Linhagem que se debruçou extensivamente sobre os fenômenos culturais, tomando o livro como fonte privilegiada em alguns trabalhos.

Há de se fazer um apontamento a respeito de tal relação. Se, por um lado, Carone não consumiu essas referências como mecanismos para desenvolver seus trabalhos. Por outro, estava minimamente atento para saber da existência dessa bibliografia que hoje se concebe como História do Livro. Na sua biblioteca pessoal, não está presente o trabalho fundacional da abordagem L’Apparition du Livre de Lucien Febvre e Henri-Jean Martin, lançado em 1958.33 No entanto, existe um motivo para isso. Carone deu seu exemplar para sua orientanda Marisa Midori Deaecto.34 O ato é um tanto simbólico. A discípula é profundamente mais conectada com tal tipo de bibliografia do que o orientador, inclusive mais do que o próprio colega Secco, mostrando uma “continuidade”, melhor seria dizer descontinuidade, que precisa ser trabalhada com ainda mais cuidado. Basta se ler seu principal trabalho, O Império dos Livros, para se ver o significativo domínio bibliográfico e diálogo com a História do Livro.35

Se Deaecto recebeu indicações de Carone para tomar contato com essa bibliografia, é possível que Secco também o tenha. Obviamente que é impossível ser taxativo a esse respeito sem buscar apontamentos do próprio Secco. Todavia, existem outros indicativos de que o professor de história contemporânea da USP tenha uma curiosidade mais aprofundada para os Annales do que o antigo mestre. Apresenta uma certa predileção pelo principal expoente da segunda geração da revista, Fernand Braudel, sendo coordenador de um grupo de estudos voltado a estudar a sua obra. Além disso, foi prefaciador, juntamente de Deaecto, da obra máxima de Braudel, O Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Filipe II.36

Consta-se outras conexões de Secco com a produção de Braudel, todavia mais importante, para os objetivos do presente artigo, são as vinculações do professor da USP com os sucessores do francês nos Annales, na verdade com o nicho que se dedicou à história do livro. Seguir-se-á o argumento de que Secco, embora tenha forjado o seu conceito de história do livro a partir de influências dominantes dos historiadores europeus do marxismo assim como Carone, traga algumas nuances da História do Livro.

Tal consideração traz consequentemente um questionamento a respeito da possibilidade de equilíbrio das abordagens marxistas e dos Annales. Sobre isso, Hobsbawm fez um interessante apontamento que pode servir de horizonte: “a relação entre a esquerda marxista e os Annales [...] foi bem mais amistosa e cooperativa” do que a bibliografia tradicional supôs. O autor realça que, na revista histórica dos marxistas britânicos Past and Present, constantemente foram feitas referências aos pesquisadores ligados aos Annales.37

Utilizando o conceito de campo de Pierre Bourdieu como horizonte analítico,38 poder-se-ia argumentar que os historiadores de esquerda e os dos Annales não eram somente competidores da definição epistemológica do saber histórico, mas também interlocutores que, no processo de concorrência intercambiavam, assumiam, renegavam ou adaptavam referenciais de suas contrapartes. As linhagens que compõem a historiografia não seriam tão rígidas quanto a primeira impressão dá a entender.

Contudo, como o próprio Hobsbawm demarcou no texto citado, todo esse processo necessita de maior investigação, é uma fronteira a ser enfrentada. Estabelece-se, assim, um horizonte interessante. Além disso, o escritor britânico faz considerações que englobam fundamentalmente a Segunda Geração dos Annales, a qual foi principalmente orquestrada por Braudel e se dedicava às temáticas estruturais da economia e da sociedade.39 O entrementes dos historiadores do marxismo e dos historiadores das mentalidades é mais díspar se comparado com os integrantes da Segunda Geração dos Annales.

VIII

Na América Latina, essas intersecções de linhagens distintas que disputam o conceito de determinadas disciplinas são significativamente mais complexas. Ao circunscrever os pesquisadores da América Latina, engloba-se atores que estão acompanhando o desenvolvendo bibliográfico de tais querelas, mas que pouco interferem nos contornos do embate na Europa. Trata-se fundamentalmente de um processo de “recepção” de ideias e de uma disputa interpretativa local.40

É nessa condição que Secco consumiu a bibliografia marxista e dos Annales. Analisar-se-á sua obra editorial buscando identificar como recepcionou as duas tradições. Sua primeira investida no campo foi no mestrado, publicado como livro em 2002. Em Gramsci e o Brasil, realiza um estudo da presença de Gramsci na bibliografia brasileira, buscando todos os autores que recorreram ao pensador italiano no país.41 Trata-se de um expoente dentro de um conjunto de estudos, muito inspirados nos historiadores do marxismo europeu, sobre a recepção do fundador do Partido Comunista Italiano no Brasil que começaram a ser lançados nos anos 1990.42

Existe um outro texto de Secco de 2002 que se mostra mais interessante para vislumbrar como reagia a essas tradições. Lançado na revista Novos Rumos, o artigo “Notas para a História Editorial de O Capital” esboça uma tentativa de enfrentar os caminhos textuais d’O Capital de Karl Marx, buscando suas traduções, críticas, apreciações etc.43 O artigo é significativamente limitado diante do tema que tenciona enfrentar, mas, como o próprio título enuncia, se coloca como uma contribuição para uma investida mais ampla. Seu valor está no domínio bibliográfico exposto dos historiadores europeus do marxismo, que foi a base para a construção do texto, e no manejo dessa tradição para enfrentar a obra máxima de Marx.

Secco revelou pouco tempo depois um amadurecimento reflexivo a respeito da bibliografia que utiliza o livro como fonte. Em 2004, publicou “Biblioteca Gramsciana: os livros da prisão de Antonio Gramsci”.44 Nessa nova colaboração, fez uma análise a partir do rico material que é a história dos Quaderni del Carcere de Gramsci, buscando esmiuçar a relação com os materiais escritos que o italiano desenvolveu em seu retiro forçado. O estudo é bem circunscrito, delimitando exclusivamente o período de prisão do intelectual (1926-1937), e traz ricos horizontes analíticos: explora os cerceamentos da leitura postos pelo regime fascista; o controle a respeito de sua escrita; o que chegava dentro da sua cela; etc.

São 20 páginas de texto que, dentro de suas limitações espaciais, lança problemáticas e as responde satisfatoriamente. Algo latente é a conexão com a História do Livro. Secco enfrenta em seu texto problemáticas que estão substancialmente vinculadas com tal tradição. Pode-se ver isso no manejo do conceito de “leitura”, que cria uma distinção clara entre o material escrito e o seu trabalho interpretativo. Procedimento que tem grande presença entre os pesquisadores franceses. Sobre tal conexão, é notória uma nota do texto na qual o autor afirma não almejar realizar um diálogo com a História do Livro, embora reconheça que o realize indiretamente.45

De fato, grande parte desse diálogo está posto de maneira indireta ou melhor seria dizer nos detalhes. Pois, não há a renúncia da montagem conceitual fundamental dos historiadores marxistas europeus, que articulam o esquema estrutura e superestrutura, expressando o trabalho com fontes escritas como uma investigação sobre um fenômeno ideológico, em prol de uma abordagem abertamente culturalista como dos expoentes da terceira geração dos Annales, que utilizam conceitos como “mentalidade”, “circulação” etc. Secco assume perspectivas e conceitos secundários de tal tradição.

A Batalha dos Livros foi redigida mais de uma década depois.46 Se eram visíveis alguns traços dos Annales no artigo de 2004 e uma posição de afastamento para com essa tradição, uma relação distinta deu-se no livro de 2017. Existe um deslocamento na produção que engloba, além da preocupação com o material escrito, diversas dimensões das práticas de leitura. Nesse movimento, destaca-se o consumo de ideias de Robert Darnton, citando-o diretamente como um horizonte para pensar o “circuito” social que envolve o consumo de livros.47

A intersecção com Darnton é particularmente interessante, não tanto pelo consumo das suas ideias por parte de Secco, mas pela aproximação de movimentos. Darnton é um dos mais expressivos expoentes da História do Livro. Apesar de não ser francês e ter uma formação acadêmica anglo-saxã, colocou-se como um dos principais debatedores dessa linhagem de pesquisa anunciada pelos Annales, inclusive elaborando diversos textos que tentam refletir e definir o campo. Iniciativa essa que se principiou em 1982 com a publicação de “O que é a História dos Livros?”, escrito que consegue cunhar categorias e estabelecer alguns horizontes para a área.48 Tal trabalho é muito importante como horizonte para diversos pesquisadores, pois divulga extensivamente essa forma de fazer histórico.

Todavia, trata-se ainda de um texto de relativa juventude, pois é um dos primeiros exercícios exclusivamente epistemológicos do autor. Com o passar do tempo, tornar-se-ia mais claro para Darnton outras problemáticas que envolvem a História do Livro e que não estavam enunciadas no primeiro texto. Nesse trajeto reflexivo, existe um escrito de maturidade que, ao retornar criticamente ao “O que é a História dos Livros?”, esboça, além de problemáticas e limitações de sua análise prévia, alguns contornos das linhagens intelectuais que se acumularam no campo. Em “‘What is the history of books?’ revisited”, Darnton pondera a influência de Edward Palmer Thompson em suas investigações. Utilizando a clássica expressão history from bellow, que demarca o intento de Thompson de explorar a história das classes mais baixas, Darnton afirma a presença dessas preocupações em sua abordagem.49 Isso se expressaria na procura por explorar os fenômenos intelectuais e culturais daqueles que nem sempre eram redatores dos livros. Não almejava tanger mais a leitura de scriptorium, reservada aos monges a fazer ruminatio, mas das populações mais pobres que em geral eram analfabetas e realizavam uma leitura coletiva mediada por uma pessoa precariamente letrada.

Duas coisas esboçam-se a partir dessa consideração. A primeira é intersecção criativa entre os historiadores do marxismo europeu e a História do Livro destacada dessa vez por um expoente da segunda linhagem. A segunda é a identidade parcial entre Secco e Darnton. Convergência não no sentido que possuam abordagens iguais ou que desenvolvam diálogos diretos, mas no âmbito que encontram na tradição analítica nas quais são menos familiarizados recursos para pensar suas fontes. Pesquisadores de espaços distintos do globo e de maneiras distintas vislumbraram possibilidades criativas na intersecção entre Annales e Marxismo. É nessa relação construtiva com os Annales que Secco desdobrou a obra de Carone.

IX

Contrapor A Batalha dos Livros de Secco e O Marxismo no Brasil de Carone possibilita o estabelecimento de algumas conclusões a respeito de transformações do modo de conceber a história do livro de esquerda no Brasil. A primeira é que se pode constatar de maneira clara uma dimensão acumulativa no campo de estudo a partir da análise desses dois trabalhos. Pode-se falar de uma reunião mais significativa de fontes, criando uma visão histórica mais ampla sobre a história do livro no Brasil, ao longo do tempo. Nesses termos, mostra-se concebível falar de uma “continuidade”, melhor seria apontar a continuidade de um problema de pesquisa.

A segunda conclusão é um pouco mais elaborada e vai mais na direção do “mito da continuidade” problematizado por Skinner. A relação entre um professor e estudante pode se manifestar de distintas maneiras. Por um ângulo, existe a possibilidade dos sucessores tentarem constituir uma ruptura total com os mestres. O caso dos fundadores dos Annales é representativo desse caso. Marc Bloch e Lucien Febvre, orientados respectivamente pelos metódicos Charles Seignobos e Gabriel Monod, consagraram-se intelectualmente fazendo oposição ao legado dos antigos mestres, embora a ruptura de fato seja um tanto questionável.50 Por outro ângulo, existe a possibilidade do aprendiz se projetar como um legatório ou um continuador, procedimento um tanto generalizado no mundo intelectual.

Esses procedimentos de “continuidade” referem-se em geral a aparências de determinados processos e não fenômeno histórico. Estão conectados com os discursos de legitimação de determinadas carreiras. Muitas vezes simplificam os fenômenos intelectuais a uma mera questão de escolha, desconsiderando processos formativos mais amplos. Por isso, faz mais sentido no presente caso se falar em uma “continuidade” mediada de Secco diante de Carone.

Em outras palavras, após anos de leitura e reflexão, Secco em A Batalha dos Livros se distancia da perspectiva de Carone de fazer um levantamento das edições e das editoras de esquerda, para enfrentar os fenômenos da leitura e da apropriação do livro:

Ora, como sabem os bibliófilos, a leitura é um mistério e sua história é a mais difícil de todo o circuito que existe em torno do livro. É preciso, por isso, tatear a circulação, a oferta, os preços, os leitores potenciais e só depois tocar a leitura como a forma de realização plena do livro.51

Há continuidade crítica uma vez que o próprio Secco estabelece uma filiação, afirmando que segue encaminhamentos que não foram desenvolvidos pelo mestre: “Edgard Carone foi o pioneiro no estudo da difusão dos livros marxistas. Mas tratava-se, como ele mesmo dizia, do primeiro degrau da análise. Deixa-se de lado ‘o resultado intelectual ou ideológico desta leitura’”.52

Nesse trajeto, Secco se manteve como um marxista, jamais renunciando as suas categorias fundamentais como o esquema de classes. No entanto, atentou-se às contribuições postas pelos Annales no que se refere aos estudos das fontes editoriais, oferecendo um maior refino nas suas análises dos fenômenos culturais. Em uma perspectiva marxista, poder-se-ia apontar que o professor da USP se concentra menos no livro como fenômeno mercadoria e começa a entendê-lo como um componente central da superestrutura. Em certa medida, a abordagem foi tornando-se mais rica, contemplando nas suas pesquisas uma intepretação de cultura que ia além das obras, percebendo as interações sociais que as rodeiam e oferecem sentido. Portanto, o conceito de história nos entretempos e nos entrementes de Carone e Secco se caracteriza por manutenções e transformações. No primeiro âmbito, ocorre a preservação do horizonte marxista; no segundo, o uso de referenciais dos Annales. Nesse movimento, a história vai se fazendo, textual e socialmente.

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Resumen

El presente artículo pretende aportar a la historia del concepto de historia del libro a partir de la comparación de los trabajos dedicados a la historia del libro de izquierdas por un estudiante y su asesor: Lincoln Secco y Edgard Carone. Al comparar el trabajo de estos dos investigadores, es posible desarrollar algunas consideraciones sobre cómo se ha transformado la investigación de este tipo de fuente en Brasil en las últimas décadas y cómo se desarrolla la relación entre un profesor y un alumno en el contexto de la producción intelectual.

Palabras clave: Historia del Libro de Izquierda; Edgard Carone; Historiadores marxistas; Historia del Concepto de Historia

Abstract

The present article aims to constitute a history of the concept of history of book through the comparison of the works dedicated to the history of the left book of a student and an advisor: Lincoln Secco and Edgard Carone. Counter the work of these two researchers, it makes it possible to develop some considerations on how the research of this type of source has been transformed in Brazil in recent decades and how the relationship of a student and advisor process in the scope of intellectual production.

Key-words: Left book’s history; Edgard Carone; European Marxist historians; history of history concept.

Recibido: 05/07/2021

Aceptado: 01/10/2021


*Mestre em Historia Social, Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP). https://orcid.org/0000-0003-0476-1600

1 Agradeço aos funcionários da biblioteca do Museu Republicano de Itu onde está o acervo de Edgard Carone. Esse texto jamais existiria sem o seu auxílio.

2 Thomas Kuhn, A estrutura das revoluções científicas, São Paulo, Perspectiva, 2000.

3 Edgard Carone, O marxismo no Brasil, Belo Horizonte, Dois Pontos, 1986 e Lincoln Secco, A Batalha dos Livros: formação da Esquerda no Brasil, Cotia, Ateliê, 2017.

4 Tomou-se o texto “História dos conceitos e história social” de Reinhart Koselleck como horizonte para enfrentar a questão. Reinhart Koselleck, Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos, Rio de Janeiro, Contraponto, PUC-Rio, 2006, pp. 97-118.

5 Lincoln Secco, Gramsci e o Brasil: recepção e difusão de suas ideias, São Paulo, Cortez, 2002.

6 Lincoln Secco, A Revolução dos Cravos e a Crise do Império Colonial Português, São Paulo, Alameda, 2004; Lincoln Secco, 25 de abril de 1974 – A Revolução dos Cravos, São Paulo, Companhia Editora Nacional, 2005.

7 Lincoln Secco, História do PT, Cotia, Ateliê, 2011; Lincoln Secco, Histoire du Parti des travailleurs au Brésil, Paris, Éditions du Sextant, 2016.

8 Os dois memorias de Lincoln Secco, o primeiro para ingresso como professor da USP e o segundo para o concurso de livre docência, são fontes preciosas para a constituição desse trabalho. Os documentos foram publicados no site: https://gmarx.fflch.usp.br/arquivo-lincoln-secco. O memorial de Carone para ingresso na USP, menos descritivo do que Secco, também foi consultado e está disponível para consulta na biblioteca do Museu Republicano de Itu.

9 Quentin Skinner, Visões de Política, Algés, Difel, 2005, pp. 96-103.

10 Marisa Midori Deaecto y Lincoln Secco, Bibliomania, Cotia, Ateliê, 2015.

11 Marisa Midori Deaecto y Lincoln Secco (org.), Leituras marxistas e outros estudos, São Paulo, Xamã, 2004.

12 Marisa Midori Deaecto y Lincoln Secco, “O homem e os livros: a obra de uma vida”, en Marisa Midori Deaecto y Lincoln Secco (org.), Leituras marxistas e outros estudos, São Paulo, Xamã, 2004, pp. 9-16.

13 Para um debate interessante sobre o processo ocidental de organização de biblioteca, confira o texto de David Mckitterick, “A biblioteca como interação: a leitura e a linguagem da bibliografia”, en Marc Baratin y Christian Jacob, O Poder das Bibliotecas: a memória dos livros no Ocidente, Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 2000, pp. 95-107.

14 Recentemente tal escrito ganhou uma versão com alterações em espanhol na revista Políticas de la Memoria. Marisa Midori Deaecto y Lincoln Secco, “La Biblioteca Socialista Edgard Carone: Formas de pensamiento y memorias de los libros. Política de la memoria de los libros”, Políticas de la Memoria, n° 18, verano 2018/2019, pp. 186-196.

15 Antonio Candido de Mello e Souza, “O significado de ‘Raízes do Brasil’”, en Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil, 26° ed, São Paulo, Companhia das Letras, 1995, pp. 9-24.

16 Mostra-se inevitável rememorar o livro Conciliação e reforma no Brasil de José Honório Rodrigues, obra a qual desenvolve uma percepção semelhante à de Carone a respeito do Brasil como o reino da negociação diante da ruptura. José Honório Rodrigues, Conciliação e reforma no Brasil, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1965.

17 Edgard Carone, A Primeira República, São Paulo, Difel, 1988; A República Velha I, São Paulo, Difel, 1988; A República Velha II, São Paulo, Difel, 1983; A Segunda República, São Paulo, Difel, 1978; A República Nova, São Paulo, Difel, 1982; O Estado Novo, São Paulo, Difel, 1988; A Terceira República, São Paulo, Difel, 1976; A República Liberal I, São Paulo, Difel, 1985; A República Liberal II, São Paulo, Difel, 1985; A Quarta República, São Paulo, Difel, 1980.

18 O primeiro livro de Edgard Carone sobre o período republicano foi Revoluções do Brasil Contemporâneo, publicado 1965. Essa obra se desdobraria em diversos outros volumes mais tarde. Edgard Carone, Revoluções do Brasil Contemporâneo, 1922-1938, São Paulo,
Desa, 1965.

19 Por gerações dos Annales, seguiu-se a distinção concebida por Peter Burke em A Escola dos Annales e a de François Dosse em História em Migalhas. François Dosse, História em Migalhas, São Paulo, Ensaio, Campinas, Unicamp, 1992. Peter Burke, A Escola dos Annales
(1929-1989): a revolução francesa da historiografia
, 2a ed., São Paulo, Unesp, 2010.

20 Sobre o assunto cf., Paulo Miceli, “Sobre História, Braudel e os Vaga-Lumes. A Escola dos Annales e o Brasil (ou vice-versa)”, en Marcos Cezar de Freitas (org.), Historiografia Brasileira em Perspectiva,
2a ed., São Paulo, Contexto, 1998, pp. 256-270.

21 Marc Bloch, Apologie pour l’histoire, Paris, A. Colin, 1949; Marc Bloch, La société féodale, Paris, A. Michel, 1949; Lucien Febvre, Un destin: Martin Luther, Paris, Presses Universitaires de France, 1945.

22 Existem alguns textos de Carone os quais rompem com essa conceitualização, por exemplo o livro de memórias Memória da Fazenda Bela Aliança. Tratam-se de âmbitos secundários que serão parcialmente considerados. Edgard Carone, Memória da Fazenda Bela Aliança,
Belo Horizonte, Oficina do Livro, 1991.

23 Utilizo o referencial conceitual de Perry Anderson que separa duas gerações de escritores marxistas: clássicos e ocidentais. Perry Anderson, Considerações sobre o marxismo ocidental, 2a ed., São Paulo, Boitempo, 2019.

24 Luiz Bernardo Pericás realiza uma historicização dessa tradição em Caminhos da Revolução Brasileira. Luiz Bernardo Pericás, “Introdução – Caminhos da Revolução Brasileira”, en Luiz Bernardo Pericás (org.), Caminhos da Revolução Brasileira, São Paulo, Boitempo, 2019, pp. 9-90.

25 Leôncio Basbaum, História Sincera da República, Rio de Janeiro, Livraria São José, 1957.

26 Sobre tais coleções de estudo europeu, cfr. Com Luccas Eduardo Maldonado, “Edição e Revolução na América Latina: um diálogo com o historiador argentino Horacio Tarcus sobre o marxismo latinoamericano”, Crítica Marxista, n° 48, p. 165-177, 2019.

27 Bert Andréas, Le Manifeste Communiste de Marx et Engels, Milão, Feltrinelli, 1963.

28 Edgard Carone, “A trajetória do Manifesto do Partido Comunista no Brasil”, en Edgard Carone, Da direta à esquerda, Belo Horizonte, Oficina do Livro, 1991, pp. 93-99.

29 Edward Thompson, A miséria da teoria ou um planetário de erros, Rio de Janeiro, Zahar, 1981.

30 Pedro Ribas, La introducción del marxismo en España (1869-1939): ensayo bibliográfico, Madrid, Ediciones de la Torre, 1981.

31 Eric J. Hobsbawm (org.), Storia del marxismo, Torino, Einaudi, 1978. Existe uma edição brasileira dessa coleção publicada pela Paz e Terra.

32 Eric J. Hobsbawm, “Prefácio”, en Eric J. Hobsbawm (org.), História do marxismo: O marxismo no tempo de Marx, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979, pp. 11-32.

33 Lucien Febvre y Henri-Jean Martin, L’Apparition du Livre, Paris, A. Michael, 1971.

34 Marisa Midori Deaecto, “Prefácio à 2º Edição Brasileira”, en Lucien Febvre y Henri-Jean Martin, O Aparecimento do Livro, São Paulo, EDUSP, 2017, p. 21.

35 Marisa Midori Deaecto, O Império dos Livros: Instituições e Práticas de Leitura na São Paulo Oitocentista, São Paulo, EDUSP, 2018.

36 Marisa Midori Deaecto y Lincoln Secco, “Prefácio à Edição Brasileira de O mediterrâneo de Fernand Braudel”, en Fernand Braudel, O Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Filipe II, São Paulo, EDUSP, 2017, pp. 17-57.

37 Eric J. Hobsbawm, “A história britânica e os “Annales”: um comentário”, en Eric J. Hobsbawm, Sobre História, São Paulo, Companhia das Letras, 1998, p. 195.

38 Pierre Bourdieu, “O Campo Científico”, em Renato Ortiz (org.), Pierre Bourdieu: sociologia, São Paulo, Ática, 1983, pp. 122-155.

39 Sobre o assunto, o historiador da historiografia dos Annales Carlos Antonio Aguirre Rojas faz uma relevante ponderação, “é também interessante comprovar como a partir deste jogo de múltiplos exercícios de comparação histórica, aparece como fundamental o diálogo persistentemente retomado, e resolvido sempre de maneiras distintas, entre esses diversos Annales e os igualmente diversos marxismos com que convivi, e a respeito dos quais definiram-se tanto em relações de aproximação ou de clara aliança, como de aberta separação e distância, passando também por uma receptividade firme mas matizada, ou por um ceticismo não obstante atento de seus principais aportes. Tal diálogo fundamental na história dos Annales tem sido permanentemente negligenciado pelos distintos estudiosos da corrente, aparecendo só de maneira tangencial ou periférica em seus ensaios, artigos e livros”. Carlos Antonio Aguirre Rojas, Uma história dos Annales (1921-2001), Maringá, UEM, 2004, p. 18.

40 Utiliza-se o referencial de recepção cunhado pelo historiador Horacio Tarcus em Marx en la Argentina. Horacio Tarcus, Marx en la Argentina, Buenos Aires, Siglo Veintiuno, 2013, pp. 21-59.

41 Secco, op. cit., 2002.

42 Sobre isso cfr. com Carlos Nelson Coutinho, “O Gramsci no Brasil: Recepção e Usos”, en João Quartim de Moraes, História do Marxismo no Brasil. Teorias. Interpretações, 2a ed., Campinas, Ed. UNICAMP, 2007, p. 188.

43 Lincoln Secco, “Notas para a História Editorial de O Capital”, Novos Rumos, nº 37, 2002, pp. 43-62.

44 Lincoln Secco, “Biblioteca Gramsciana: os livros da prisão de Antonio Gramsci”, Revista de História, nº 150, 2004, pp. 209-228.

45 “Evidentemente, este artigo não busca fazer referências aos avanços teóricos na área específica da História do Livro senão indiretamente. Trata-se de abordar a maneira como Gramsci tratou de temas semelhantes: mediação editorial, formas de pensamento, estratégias de leitura etc.”. Ibidem, p. 210.

46 Lincoln Secco, op. cit., 2017.

47 Robert Darnton, A questão dos livros, São Paulo, Companhia das Letras, 2010.

48 Robert Darnton, “O que é a História dos Livros”, en Robert Darnton, O Beijo de Lamourette: Mídia, Cultura e Revolução, São Paulo, Companhia das Letras, 1990, pp. 109-131. O texto foi publicado em espanhol pela revista Prismas. Revista de Historia Intelectual, n° 12, Vol. 2, 2008, pp. 135-156.

49 Robert Darnton, “What is the history of books? Revisited”, Modern Intellectual History, n° 4, Cambridge, Cambridge University Press, pp. 495-496, 2007. Há uma edição em português desse texto publicado pela revista ArtCultura. Robert Darnton, “‘O que é a história dos livros’ revisitado”, ArtCultura, Uberlândia-MG, Univ. Federal de Uberlândia, Vol. 10, nº 16, pp. 153-167, jan.-jun. 2008. O texto foi publicado em espanhol pela revista Prismas. Revista de Historia Intelectual, n° 12, Vol. 2, 2008, pp. 157-168.

50 Sobre tal relação, cfr. com Gérard Noiriel, “Os Annales, o “não confirmo” e o mito da eterna juventude”, en Fernando Novais y Rogério F. da Silva, Nova história em perspectiva: volume 2, São Paulo, Cosac Naify, 2013, pp. 158-184.

51 Lincoln Secco, op. cit., 2017, p. 25.

52 Idem.


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